terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Tia Dafne Parte I

Estávamos em uma boate qualquer, o som estava alto, as pessoas estavam dançando, interagindo. As luzes formavam um caleidoscópio extasiante e, de tempos em tempos, uma cortina de fumaça cobria a pista de dança. Eu observava aquele cenário com certo desinteresse, como se não fizesse parte dele, mas, ao mesmo tempo, eu queria gravar tudo o que estava acontecendo. Dafne, uma garrafa de tequila e eu... Isso era o meu mundo naquele momento.

Gosto de me manter sóbria, mas ela havia insistido tanto para que eu a acompanhasse na tequila, simplesmente não pude resistir. Afinal se ela já me descontrolava naturalmente, que mal poderia haver? Eu bem o sabia, mas optei por iludir a mim mesma.

Sua eloqüência era característica nata. Desde que nos conhecemos, eu não conseguia dizer “não” para aqueles olhos lindos, que, de tão enigmáticos, eu não conseguia decifrar nem a cor. Era namorada de meu tio. Tinha vinte e sete anos, impecavelmente educada e muito atraída por ciências exatas. Quando a vi pela primeira vez, senti que já a conhecia. “Deve ser de outra vida”, supôs Dafne.

Sempre odiei vê-la como parenta. Meu tio, durante um almoço familiar, sugeriu que eu a chamasse de “tia Dafne”. De imediato, minha vontade foi quebrar uma garrafa de vinho em sua face. Não só pelo fato de considerá-lo um calhorda, mas por ter me sentido extremamente estranha com aquela possibilidade.

A aparência de Dafne, de fato, chamava a atenção. Tinha cabelos castanho-claros, não muito compridos, com algumas mechas loiras espalhadas por entre os fios. Os lábios rosados quase sempre carregavam um sorriso irônico, como se ela pudesse enxergar todos os nossos defeitos e rir-se deles. Mas seus olhos nunca pareciam os mesmos. Eu era enlouquecida por seus olhos. Ninguém, no mundo, os tinha tão lindos.

Vê-la de biquíni era uma tortura. Toda vez que isso acontecia, minhas coxas espremiam-se uma contra a outra, numa tentativa frustrada de conter a excitação. Seu corpo era como uma escultura barroca, tamanha a riqueza de traços. Os seios eram médios pareciam encaixar perfeitamente em minhas mãos. A cintura fina terminava em quadris largos. As pernas eram bem torneadas, sempre dando a impressão de uma maciez absurda. Dafne despertava-me a vontade de senti-la de todas as formas possíveis. Apreciá-la lenta e detalhadamente. Sua essência deixava-me inebriada. Minha mente cegava por vontade de tocá-la, mas, ao mesmo tempo, temia qualquer tipo de contato, pois apesar de eu odiar meu tio, isso não mudava o fato de que Dafne era sua namorada.

Ali, naquela danceteria, eu sentia uma estranha sensação de liberdade. Éramos duas anônimas no meio de tanta gente. Eu não precisava disfarçar quando meus olhos caíam em seu decote, ou desviar de seu toque, temendo que alguém pudesse notar minha reação. Ela trajava um vestido preto, não muito curto, não muito longo. Sua barra roçava na metade das coxas, deixando-me invejada por tamanha regalia. O decote em V era um pouco mais atrevido, privilegiava seu colo bonito e os seios firmes. Quando ela dançava, eu me perguntava se ela dançava por causa da música ou a música só estava tocando por causa dela. Dafne esbanjava sensualidade, era como se estivesse nua. As curvas de seu corpo se destacavam por entre as das outras mulheres e ela, com uma lascividade quase que inconsciente, movia o corpo conforme o ritmo do som... e do pulsar de minhas veias. Suada, com o cabelo preso em um elástico e a franja rebelde caindo-lhe sobre o olho, ela veio até mim.

- Vamos? – perguntou enquanto jogava, graciosamente, a franja para trás

Ao tentar levantar, senti o efeito da bebida. Tonteei por alguns instantes e apoiei-me em seus ombros. Dafne era toda risos, encantando-me com as covinhas de suas bochechas.

- Melhor tomarmos um táxi. – disse ela

- Primeiro você precisa me ajudar a sair daqui. – respondi, rindo

Ela envolveu minha cintura com um dos braços e apoiou um dos meus em seu pescoço. Cruzou os dedos com os meus e fomos, abraçadas, até a porta de saída. Minha tontura não era mais culpa exclusiva da tequila. Senti o tom macio de sua pele e percebi o quanto seu rosto estava próximo do meu. Estremeci.

Ao entrarmos no táxi, deitei a cabeça em seu ombro. Seus dedos passeavam por entre os fios de meus cabelos e eu tentava decifrar-lhe os pensamentos, sentindo seu perfume. O motorista olhava-nos pelo espelho retrovisor com estranheza, seus lábios expressavam um sorriso malicioso. Ignorando-o, Dafne debochou:

- Desculpe-me, se eu soubesse que você era tão fraquinha para bebidas, não teria insistido. Esqueci que você é um bebê.

- Tenho dezenove anos, não sou criança. Além do mais, não bebi só por sua causa. – menti

Dafne gargalhou, desacreditando em minhas palavras. Sua risada era tão agradável que eu evitei falar até que ela parasse por completo.

Após pararmos em frente à minha casa, onde ela também estava hospedada, descemos do carro e o motorista despediu-se:

- Boa diversão, garotas!

Trocamos olhares desconfiados e começamos a rir histericamente. Meu corpo balançava enquanto eu tentava equilibrar-me no salto do sapato. Eu não sabia se Dafne ria de mim ou do motorista. Eu não sabia nem do que eu mesma estava rindo.

Quando conseguimos retomar o controle, Dafne voltou a me abraçar pela cintura e caminhamos em direção à porta. Ao chegar perto da porta da casa, encostei-me em um pilar para tirar os sapatos, pois não queria acordar ninguém.

- O que será que ele estava pensando? – perguntou Dafne, referindo-se ao motorista, enquanto se aproximava para me ajudar

- O idiota deve ter pensado que você e eu somos namoradas. – respondi

Dafne soltou os cabelos passou a ajeitá-los com as pontas dos dedos.

- Por que idiota? Sou tão dispensável que você não consegue nem pensar na idéia de ficar comigo? – perguntou ela, rindo

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